NÓS FAZEMOS A DIFERENÇA NO MUNDO...

Nós fazemos a diferença no mundo
"Eu sou a minha cidade, e só eu posso mudá-la. Mesmo com o coração sem esperança, mesmo sem saber exatamente como dar o primeiro passo, mesmo achando que um esforço individual não serve para nada, preciso colocar mãos à obra. O caminho irá se mostrar por si mesmo, se eu vencer meus medos e aceitar um fato muito simples: cada um de nós faz uma grande diferença no mundo." (Paulo Coelho)

Na qualidade de Cidadão, afirmamos que deveríamos combater o analfabetismo político, com a mesma veemência que deveria ser combatido o analfabetismo oficioso no Brasil. Pois a politicagem ganha força por colocarmos poder de importantes decisões nas mãos de quem não se importa com o que irá decidir.
Concordo com Bertolt Brecht, quando afirma que: "O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos”. Ele não sabe o custo de vida, nem que o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato, saneamento, mobilidade urbana, e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. “Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce à prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.”

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

A trajetória de Dilma, da guerrilha ao poder

Revista Época - 05/12/2011
O livro "A vida quer é coragem", do jornalista Ricardo Amaral, revela novos episódios da história da presidente até o momento em que ela chegou ao Planalto
A fotografia abaixo é inédita. Ela foi tirada em novembro de 1970 e mostra a presidente Dilma Rousseff aos 22 anos. Dilma já passara por 22 dias de tortura e respondia na ocasião a um interrogatório na sede da Auditoria Militar do Rio de Janeiro. A imagem foi desencavada do processo contra Dilma na Justiça Militar graças ao jornalista Ricardo Batista Amaral e faz parte do livro que relata a trajetória da presidente desde sua juventude, em Belo Horizonte, quando ingressou em organizações da luta armada contra o regime militar, até sua eleição para o Palácio do Planalto, no ano passado. A vida quer é coragem (Editora Primeiro Plano), título tirado de uma citação de Guimarães Rosa escolhida por Dilma para seu discurso de posse, chega às livrarias na primeira quinzena de dezembro. O livro é resultado em parte da posição privilegiada da qual Amaral assistiu à disputa presidencial de 2010. Como assessor da Casa Civil e da campanha de Dilma, ele testemunhou bastidores só agora relatados com a experiência de quem foi repórter político por 25 anos em Brasília, parte deles como jornalista e colunista de ÉPOCA. "Procurei fazer um relato objetivo dos fatos, como se espera de uma reportagem, sem abrir mão de explicitar meu ponto de vista", diz Amaral. ÉPOCA publica, a seguir, alguns trechos do livro, em que os leitores podem saborear a excelência do texto de Amaral.
1) O casamento na clandestinidade
Quando tomou intimidade – o que não demoraria muito – Carlos (Carlos Araújo, companheiro de Dilma) passou a chamá-la de "Nega". Depois de alguns anos de uma longa convivência, Dilma o chamaria para sempre de "Gordo". Eram Max e Estela quando foram apresentados, pouco depois do Carnaval de 1969 (num aparelho da organização Colina, no Rio). Estela ia se chamar Vanda e Luíza, depois da fusão da Colina com a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária). Ela sugeriu que ele virasse Pedro, codinome que Carlos usou por um breve tempo, sem saber que era assim que se chamava o pai da companheira. Naquela primeira reunião, Estela chamou a atenção de Max pela importância que dava ao "trabalho de massas". "Além da inteligência, ela me encantou pela beleza", recorda.
Quando voltou ao Rio pela terceira vez, Max já estava clandestino, além de apaixonado. Na pausa de uma longa reunião, Maria do Carmo Brito surgiu pela porta da cozinha com um bolo confeitado e velas acesas. Deu-se uma cerimônia de casamento revolucionária com românticos toques burgueses: o laralá da Marcha Nupcial foi cantarolado a meia-voz, para não chamar a atenção dos vizinhos, e o noivo pediu a mão da noiva a Juarez Guimarães de Brito, o dirigente máximo da organização. Pelo resto do ano, quando não estavam em missões país afora, Max e Estela dividiam aparelhos provisórios, pulando de bairro em bairro como o casal do poema "Tragédia Brasileira", de Manuel Bandeira.
2) O encontro com Iara Iavelberg, a mulher de Carlos Lamarca
Foi no final de março, antes do "casamento", que Iara chegou para dividir com Dilma a quitinete de Copacabana. Bonita, charmosa, atrevida, prestes a completar 25 anos, Iara Iavelberg era uma lenda na esquerda. De família judia do Bom Retiro, estava desquitada de um casamento precoce quando entrou na Faculdade de Psicologia da USP, despertando fantasias e preconceitos. Teve um romance pontuado de idas e vindas com José Dirceu, o jovem líder da Dissidência Comunista no movimento estudantil, um dos presos no Congresso da UNE em Ibiúna. Iara tinha deixado em São Paulo o capitão Carlos Lamarca ardendo por ela de paixão.
Iara e Dilma conheciam-se do congresso da Polop (sigla de Política Operária, organização de esquerda), de 1967. Tinham uma amiga comum, Maria Auxiliadora Lara Barcelos, a Dodora (...) Iara cuidava da aparência, vestia-se com bom gosto e racionalizava a vaidade natural: "Faz bem à autoestima. Quem se acha interessante trabalha melhor, é mais segura, dá menos bandeira", ela disse uma vez a Dodora.
Com esse papo na ponta da língua e um surpreendente cartão de crédito, Iara convenceu Dilma a "cortar essa juba fora de moda" no salão do badalado Carlos Jambert, onde serviam champanhe às clientes. "Você é uma feminista, Iara, a primeira que conheço", admirou-se a nova amiga.
3) Na Auditoria Militar
O ano de 1970 estava terminando quando Dilma passou pela angústia de todo preso tirado da cela sem explicação. Podia ser a volta da tortura ou a hora de "desaparecer", como havia ocorrido com muitos. Presa desde abril na ala feminina do Presídio Tiradentes, ela já havia recebido uma vez a visita de agentes do DOI-Codi, da equipe do capitão Maurício Lopes Lima. Ameaçaram levá-la de volta ao inferno (o centro de torturas da Operação Bandeirante, na rua Tutoia, em São Paulo).Quando Dilma perguntou se tinham autorização judicial, a resposta foi: "Você vai ver o que é juiz lá na Oban...". Numa noite no começo de novembro, Dilma foi embarcada num pequeno comboio diante do presídio. Carlos (também preso em São Paulo) estava dentro de um dos camburões, vindo do DOPS, e vislumbrou o rosto de Dilma. Na manhã seguinte, encapuzados, desembarcaram no Quartel da PE no Rio, a tenebrosa sede do DOI-Codi.
Dilma e Carlos passaram uma semana no mesmo corredor, em celas separadas, até serem levados para a sede da Primeira Auditoria Militar, uma dependência da Marinha na Ilha das Flores. Descobriram ali o motivo daquela viagem: estavam indiciados juntos no Inquérito Policial-Militar (IPM) da VAR (Vanguarda Armada Revolucionária) com outros réus presos no Rio. Na Ilha das Flores, puderam se ver, abraçar, conversar, retomar o fio da relação. "Foi uma emoção enorme aquele reencontro", lembra Carlos.
4) A candidata de Lula
Na segunda metade de 2008, os sinais de que Dilma Rousseff era a candidata à sucessão que o presidente Lula trazia no peito pareciam tão claros quanto as manhãs de Brasília. No final de uma dessas manhãs, o deputado Antonio Palocci (eleito pelo PT em 2006, depois de deixar o governo) foi confirmar direto na fonte o que a cidade inteira já comentava.
– Como é que é, presidente, vai ser ela mesma? – perguntou o ex-ministro (nem era preciso dizer o nome para Lula saber do que e de quem ele estava falando).
– É ela. Na minha cabeça já está tudo arrumado – devolveu o presidente.
Antonio Palocci subiu os dois lances de escadas, do terceiro para o quarto andar do Planalto, e foi bater no gabinete de Dilma. Eles mantinham uma boa relação, acima das antigas disputas na junta orçamentária. Ele testou:
– Como é que é, está preparada? Você sabe o que estão dizendo aí... (nem era preciso dizer o assunto para ela entender do que ele estava falando).
– Ô, Palocci! Ocê tá maluco? – ela forçava a sílaba tônica da palavra maluco, o que dava à sentença um tom de acusação. Um jeito muito Dilma de dizer as coisas: jogar o interlocutor contra a parede.
– De onde foi que ocê tirou isso? – ela cobrou.
– Tirei ali do andar de baixo – respondeu o deputado, quase se desculpando por ter levantado o assunto.
Palocci desceu pelas mesmas escadas e bateu de volta no gabinete de Lula para se queixar:
– Acabei de passar o maior constrangimento lá embaixo. Ela me disse que não tá sabendo de nada, que vocês não conversaram nada.
– Eu não conversei mesmo não. Nem vou conversar isso com ela.
Um jeito muito Lula de fazer as coisas: mandar recados pelas pessoas certas. A estratégia do presidente, ele contaria isso numa conversa depois das eleições, era criar um fato consumado.
5) O ataque a Serra no primeiro debate do segundo turno da eleição de 2010
A pesquisa Datafolha divulgada no primeiro domingo depois do primeiro turno mostrava Dilma com 54% dos votos válidos e Serra com 46% – ele herdava, segundo a pesquisa, mais da metade dos eleitores de Marina; e Dilma, apenas um quinto. (...) Quase todos no comando da campanha tinham passado pelo menos uma noite sem dormir, ou tendo pesadelos com a derrota. José Eduardo Dutra chegou a calcular o passo seguinte – renunciar à presidência do PT, como fazem os dirigentes dos partidos europeus quando perdem uma eleição.
As pesquisas internas mostravam que a situação era ainda pior: a vantagem de Dilma estava abaixo de cinco pontos, em queda constante, de acordo com os trackings da Vox Populi. Quem levou as más notícias aos coordenadores foi Chico Meira, o sócio de Marcos Coimbra na Vox. Ele chegou depois do almoço ao hotel em São Paulo onde Dilma se preparava para o primeiro debate do segundo turno, na TV Bandeirantes. Queria falar com a candidata, mas parou na antessala onde estavam Dutra, Antonio Palocci, José Eduardo Cardozo e o marqueteiro João Santana. A situação era ainda pior, ele disse, porque os eleitores passaram a avaliar mal os atributos da candidata – ela tinha deixado de ser considerada a mais preparada, mais confiável, mais sincera. Ou seja: a tendência era continuar caindo. Chico Meira tinha lágrimas nos olhos quando concluiu:
– Nós perdemos esta eleição.
Palocci e Santana tinham uma boa memória das eleições de 2006. Eles se lembravam de movimento semelhante na avaliação dos atributos de Lula logo depois do primeiro turno. Para os dois, não se tratava de uma tendência, mas de uma reação passageira dos eleitores diante de um candidato favorito que não consegue liquidar a fatura na primeira rodada. Palocci apontou a porta ao analista de pesquisas:
– Volte pra casa imediatamente. Aconteceu a mesmíssima coisa com o Lula em 2006. Você não vai mostrar isso nem pra ela nem pra ninguém.
Dilma não viu os números, mas sabia perfeitamente que sua campanha precisava de um rumo claro, que a guerra santa só interessava ao adversário e que ela tinha de aproveitar o primeiro debate para marcar a retomada. (...) Dutra e Palocci conversaram com Dilma pouco depois de ver os números da Vox Populi e perceberam que ela estava disposta a sair das cordas no primeiro debate frente a frente com Serra. Foi antes de a candidata entrar na TPD, a tensão pré-debate habitual.
Palocci começou:
– Hoje você tem que mostrar que quer mesmo ganhar esta eleição.
Dutra reforçou:
– O jogo está na sua mão.
Dilma entendeu:
– Podem deixar, hoje vai ser diferente.

Leia trecho do livro, que trata da montagem da equipe de advogados para a campanha eleitoral da então candidata à presidência: 
“Dilma pediu ao ex-ministro Márcio Thomaz Bastos para organizar a área jurídica da campanha, um pouco antes da chegada de José Eduardo Cardozo”. Bastos indicou o escritório do advogado Márcio Silva, que trabalhou nas duas eleições de Lula. Na proposta de trabalho que preparou para o PT, Márcio Silva comparou os cenários de 2002 e 2010: no primeiro caso, a estratégia do candidato governista (Serra) era esconder o presidente (FHC), e agora ocorria o contrário, a associação entre o presidente Lula e Dilma Rousseff era benéfica para a candidatura.
“Podemos classificar como preocupante o papel que a judicialização do processo eleitoral terá no resultado do pleito”, ele argumentou. Os advogados mais experientes previam uma enxurrada de ações judiciais por conta do apoio aberto de Lula à candidata. Desde que a emenda da reeleição foi introduzida, em 1995, o TSE vinha fazendo adaptações na minuciosa legislação brasileira. A composição do tribunal mudava a cada ano, e as interpretações do colegiado, também, muitas vezes ao sabor das pressões do momento.
A procuradora geral eleitoral naquele período, Sandra Cureau, chegou a dizer que uma representação contra Lula, por causa de um discurso no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, “poderia levar à cassação do registro da candidata do governo”. Dilma nunca considerou essa hipótese a sério (“Não teriam coragem para tanto”, disse uma vez), mas havia o risco de que Lula fosse proibido de participar dos programas de televisão – e isso preocupava o comando da campanha.
 Além da equipe jurídica para cuidar dos assuntos habituais numa eleição (propaganda, doações, registro de candidatura, fiscalização, etc.), a campanha decidiu contratar um advogado exclusivamente para tratar das ações envolvendo o presidente Lula. Márcio Thomaz Bastos e José Eduardo Cardozo escolheram José Gerardo Grossi. Ex-ministro do TSE, Grossi tinha firmado reputação nos tribunais superiores como um cavalheiro culto e amigo leal, advogado sagaz e criminalista competente. Entre seus antigos clientes estavam o próprio Eduardo Jorge e Francisco Lopes, ex-presidente do Banco Central no governo FHC.
Márcio Silva escalou três jovens advogados para se revezar com ele nas sessões de julgamento no TSE: Sidney Neves, que trabalhava para o PT na Bahia, Flávio Caetano, do escritório de Thomaz Bastos em São Paulo, e Luciana Lóssio, que começava a carreira em Brasília. Para completar a equipe, Silva buscou um especialista em Direito Eleitoral, Admar Gonzaga, que tinha trabalhado para o DEM em eleições anteriores.
Até o final da campanha, os advogados de Dilma iam mover ou responder a 356 ações na Justiça Eleitoral – mais de 50 por mês, mais de duas ações por dia útil, sem contar os casos na Justiça Comum e Criminal. A batalha estava apenas começando.

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