Pânico geral
Autora: Vânia Cristino
Correio Braziliense - 10/08/2011
Na esteira da crise nos EUA e na Europa, o governo decidiu pedir o arquivamento da PEC que estabelece um piso único para policiais e bombeiros no país. E também da Emenda 29, que prevê mais recursos para a saúde. Juntas, elas implicavam gastos de R$ 54 bilhões.
Investidores perdem a confiança nas autoridades para reverter a recessão mundial. Bovespa tomba 8,08%, a maior queda desde outubro de 2008
Apesar de todos os esforços das autoridades governamentais e da ação coordenada dos bancos centrais para garantir a tranquilidade dos investidores, os mercados financeiros globais tiveram ontem o pior dia desde o auge da crise de 2008, quando ruiu o banco norte-americano Lehman Brothers. As bolsas de valores contabilizaram perdas monstruosas e o pânico de que o mundo esteja à beira de uma nova recessão tornou-se latente. "Os tempos são duros e precisamos estar preparados para proteger o país desta grave crise", disse a ministra-chefe da Casa Civil, Gleise Hoffman. O governo teme que, a exemplo de três anos atrás, os empresários suspendam investimentos e demitam funcionários e os consumidores reduzam as suas compras.
Os prejuízos se espalharam por todo o planeta, depois da decisão da agência de classificação de risco Standard & Poor"s (S&P) de rebaixar a nota dos Estados Unidos na última sexta-feira. A Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) chegou a cair quase 10% (exatos 9,47%) e, por pouco, não teve de suspender os negócios por meia hora para esfriar a cabeça dos operadores. Mesmo assim, cravou baixa de 8,08%, nos 48.668 pontos. Foi o maior retrocesso desde 22 de outubro de 2008. O tombo fez o valor de mercado da empresas brasileiras encolher R$ 146,9 bilhões apenas ontem. No acumulado do ano, a bolsa paulista já recuou 29,78%, com o valor das companhias cedendo R$ 618,3 bilhões. Nesta terça-feira, uma hora depois da abertura, as bolsas asiáticas acumulavam severas perdas: Tóquio (-4,07%), Seul (-5%) e Hong Kong (-6,05%.
Derretimento
Nem mesmo as declarações do presidente dos EUA, Barack Obama, de que a maior economia do planeta está preparada para sair do atoleiro em que se encontra foi suficiente para reverter o pessimismo. Pelo contrário. A fala do líder norte-americano foi considerada fraca e arrogante, o que ajudou a empurrar os preços das ações ladeira abaixo. Na Europa, onde a Itália e a Espanha, a terceira e a quarta maiores economias da Zona do Euro, estão sob descrédito total, o tombo também foi violento. Em Frankfurt, a bolsa terminou o dia com queda de 5,02%. Londres despencou 3,39%. Em Milão, a baixa foi de 2,35% e, em Madri, chegou a 2,44%. Já a bolsa de Paris perdeu 4,68%.
Somente em agosto, as empresas europeias se desvalorizaram em US$ 932 bilhões, quantia maior do que a soma dos PIBs (Produto Interno Bruto) da Grécia, da Irlanda e de Portugal, que já foram à bancarrota.
Nos Estados Unidos, a situação não foi diferente. As bolsas do país também fecharam no pior nível desde 2008. Em Nova York, o índice Dow Jones cedeu 5,55% e a Nasdaq, 6,66%. Os investidores que tiraram dinheiro dos pregões correram para títulos emitidos pelo Tesouro norte-americano, mesmo depois do rebaixamento feito pela S&P, e para o ouro, que teve alta de 5,15%, chegando a US$ 1.713. "Aconteceu o que todo mundo esperava", resignou-se o diretor de Política Monetária do Banco Central do Brasil, Aldo Luiz Mendes. Mas, segundo ele, o Brasil está muito bem preparado para enfrentar todas as turbulências. Além das reservas internacionais de US$ 348 bilhões, a instituição tem R$ 420 bilhões em depósitos compulsórios dos bancos, que podem ser liberados em caso de escassez de crédito para o setor produtivo e para os consumidores.
Excesso de dívida
Assustada com o que pode vir pela frente, caso os Estados Unidos e a Europa não resolvam rapidamente os problemas decorrentes do superendividamento, a presidente Dilma Rousseff pediu calma e classificou de precipitada a avaliação feita pela S&P sobre os Estados Unidos. Quem acompanha atentamente o dia a dia do mercado garante, no entanto, que somente palavras positivas não diminuirão o nervosismo. Por uma simples razão: é enorme a desconfiança de que o grupo dos sete países mais ricos do mundo, o G-7, e o Banco Central Europeu (BCE) não têm poder suficiente para combater a crise. "O discurso é maior do que o poder de fogo", disse o economista-chefe do Banco de Investimento Sul América, Newton Rosa. Ele destacou o que o que todo mundo sabe: os recursos do Fundo de Estabilização da Zona do Euro, com 440 bilhões de euros, não são suficientes para a recompra de toda a dívida de países como Espanha e Itália. "O mercado está com medo do que ainda pode vir", salientou.
Além do grave problema fiscal, a Itália atravessa, no momento, uma série crise política. O jornal Corriere della Sera divulgou ontem uma "carta secreta", enviada ao governo daquele país pelo BCE. Nela, a autoridade monetária da Zona do Euro faz exigências pesadas para ajudar a
economia italiana a sair da crise, como um calendário para a implantação das medidas de austeridade, assim como o corte de despesas e a venda de estatais.
economia italiana a sair da crise, como um calendário para a implantação das medidas de austeridade, assim como o corte de despesas e a venda de estatais.
De imediato a oposição ao primeiro-ministro da Itália, Sílvio Berlusconi, pediu explicações ao governo. "Queremos saber exatamente o que o BCE e as instituições internacionais estão exigindo da Itália. Um governo impotente e totalmente desacreditado e, agora, sob tutela deve ao menos esclarecer qual é a real situação", exigiu Pierluigi Bersani, chefe do Partido Democrata (PD, de esquerda).
O governo espanhol, por sua vez, tratou de divulgar o teor da conversa por telefone mantida pelo primeiro ministro, José Luis Zapatero, com Barack Obama. Os dois analisaram a situação econômica global, os problemas da dívida pública e o crescimento e concordaram com a necessidade de " trabalhar de forma coordenada para evitar a desaceleração" da economia mundial.
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