NÓS FAZEMOS A DIFERENÇA NO MUNDO...

Nós fazemos a diferença no mundo
"Eu sou a minha cidade, e só eu posso mudá-la. Mesmo com o coração sem esperança, mesmo sem saber exatamente como dar o primeiro passo, mesmo achando que um esforço individual não serve para nada, preciso colocar mãos à obra. O caminho irá se mostrar por si mesmo, se eu vencer meus medos e aceitar um fato muito simples: cada um de nós faz uma grande diferença no mundo." (Paulo Coelho)

Na qualidade de Cidadão, afirmamos que deveríamos combater o analfabetismo político, com a mesma veemência que deveria ser combatido o analfabetismo oficioso no Brasil. Pois a politicagem ganha força por colocarmos poder de importantes decisões nas mãos de quem não se importa com o que irá decidir.
Concordo com Bertolt Brecht, quando afirma que: "O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos”. Ele não sabe o custo de vida, nem que o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato, saneamento, mobilidade urbana, e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. “Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce à prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.”

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Textos das Revistas de grande porte nacional...

Veja - 24/01/2011

UMA BEBIDA AMARGA
Explorar politicamente o ressentimento e a amargura dos pobres em relação aos ricos e a mais antiga e eficiente das bandeiras políticas. Agora, a começar pelo FMI, esta sendo criado um consenso de que o abismo entre quem tem muito e quem tem pouco não se fecha só com o aumento das oportunidades e da mobilidade social

Originalmente, os técnicos do Programa de Desenvolvimento da ONU desenharam como uma pirâmide a tabela mostrando a concentração da renda no mundo em 1992. Ela teria sido esquecida não fosse a ideia, de autor anônimo e até hoje não repetida, de trocar retas por curvas. Os mesmos dados, então, desenharam no papel uma taça de champanhe. Mas não uma raça qualquer. Os números mostrando que 20% das pessoas mais ricas do mundo eram donas de 82,7% de toda a renda do planeta assumiram o perfil da taça que, segundo a lenda, foi moldada nos seios da rainha Maria Antonieta. Grande admiradora de champanhe, ela entregou o pescoço ao carrasco nove meses depois de o marido, Luís XVI, ser guilhotinado pelos vitoriosos da Revolução Francesa. A frenética descida das lâminas sobre pescoços nobres se justificaria, ao fim e ao cabo, pelo triunfo da "Liberdade, Igualdade e Fraternidade". Como a célebre taça da bebida amarga da desigualdade nesta página demonstra, não é separando a cabeça dos ricos de seu corpo que se distribui igualitariamente a renda. O mapa mundial da desigualdade de 1992, quando desenhado com os dados de 2006, ficou mais feio e mais apropriado para ilustrar o fenômeno da concentração de muito nas mãos de poucos: ele parece um abismo.

Nos últimos meses, surgiram diversas iniciativas políticas e acadêmicas, ambas pós-ideológicas, de revisitar esse abismo. São investidas corajosas depois de um século afogado em sangue de vítimas que tombaram em nome da utopia igualitária do comunismo, que, onde triunfou, conseguiu apenas criar sociedades em que alguns poucos eram mais iguais do que a maioria. A questão da desigualdade, finalmente, está produzindo estudos focados em entender como os abismos sociais afetam a realidade das pessoas - estejam elas no topo ou na base. Dominique Strauss-Kahn, o diretor-presidente do Fundo Monetário Internacional (FMI), justamente a instituição que no auge do radicalismo substituiu os reis Capeto como alvo do ódio dos despossuídos, deu a primeira contribuição.

Strauss-Kahn avançou a discussão ao afirmar que a desigualdade não é apenas um sintoma de distorções econômicas e sociais que, uma vez corrigidas, influenciam beneficamente todo o conjunto. Para ele, a desigualdade, especialmente entre paises, "corrompe o tecido social". Por essa razão, ela precisa ser atacada diretamente. Não se trata apenas de uma mudança de retórica. Strauss-Kahn está reverberando outras vozes segundo as quais não é somente a pobreza que fere - o que machuca mais o ser humano em todas as suas dimensões é a pobreza próxima da riqueza. Diz Strauss-Kahn: "Quanto mais desigual o país, piores são seus indicadores sociais, mais ruinosos seus indicadores de desenvolvimento humano e mais altas suas taxas de insegurança econômica e ansiedade". O economista que dirige o FMI é inteligente demais para estar sugerindo que a vida é melhor em um país onde todos, sem exceção, sobrevivam com apenas 2 dólares por ano. Ele não está dizendo que a miséria nivelada traz felicidade. O que ele aponta, em consonância com outros estudiosos, é que, quando o abismo social que separa os ricos dos pobres é muito profundo e intransponível, as políticas públicas ficam menos eficientes para mitigar os males sociais normalmente associados apenas à pobreza. Não se trata de cristianismo, nem de marxismo, mas de pragmatismo. Para que todos vivam melhor, inclusive os mais ricos, o ideal é que o fosso material a separar as pessoas seja menos profundo. Tudo funciona melhor em um ambiente com diferenças menos agudas.

Quem melhor materializou essa abordagem pós-ideológica e pós-caritativa do problema da desigualdade foi a dupla de epidemiologistas ingleses Richard Wilkinson e Kate Pickett, autores do livro The Spirit Level (O Nível Espiritual), ainda sem tradução para o português. Antes de sucumbirem ao proselitismo convencional de outros livros semelhantes - já no fim do livro, felizmente -, Wilkinson e Pickett mergulham com rigor na tarefa de descobrir, afinal, que fenômenos sociais são mais ou menos influenciados pela desigualdade de renda e riqueza. Que fatores contribuem para minimizar os efeitos danosos da desigualdade e quais os catalisam? As conclusões variam da confirmação científica e estatística de constatações do senso comum a espantosas descobertas. No primeiro caso, situa-se a conclusão de que desigualdades dentro de uma mesma cidade são mais destrutivas do que aquelas verificadas em um mesmo estado, que ferem ainda menos do que as do país e menos ainda entre paises. São confirmações do ditado popular segundo o qual "é melhor ser um grande homem em uma pequena cidade do que um qualquer em uma cidade grande". Na segunda categoria, a das descobertas notáveis, Wilkinson e Pickett informam, por exemplo, que a porcentagem de pessoas obesas e a população carcerária tendem a ser maiores em países mais desiguais. Qual a razão disso? Os autores são epidemiologistas, sabem medir bem as grandezas, mas não tem todas as respostas para seus achados. A explicação que eles oferecem para o crescimento simultâneo da obesidade mórbida e da população carcerária é que onde existe forte desigualdade de renda e riqueza os indicadores sociais tendem a piorar todos ao mesmo tempo.

O livro The Spirit Level dos estudiosos ingleses surpreende também quando relata os fenômenos sociais menos afetados pela desigualdade. O mais interessante deles é a idade em que as pessoas tendem a cometer crimes. Wilkinson e Pickett compararam as mais confiáveis estatísticas de crimes cometidos em regiões que, por rodos os padrões, se situam em pólos opostos nas escalas de desigualdade. Eles se debruçam mais sobre a realidade policial no País de Gales, no Reino Unido, região com os menores índices de desigualdade do mundo, e comparam seus números com os de Chicago, nos Estados Unidos, área de índices elevadíssimos de desigualdade social e econômica. As curvas dos gráficos de crime por idade nas duas cidades são idênticas. Também coincidem nas duas regiões de realidades sociais totalmente distintas as curvas que traçam o sexo dos criminosos. É uma constatação extraordinariamente intrigante. Em que as estatísticas de crime são mais afetadas pela desigualdade? No volume dos delitos. O número de crimes em Chicago é trinta vezes maior do que o registrado pela polícia no País de Gales. Os ingleses poderiam ter sido mais exatos e calibrado as estatísticas comparativas por outros fatores como desemprego, lares desfeitos, crianças fora da escola, prevalência de drogas ou concentração populacional. Não o fizeram em parte por sua convicção de que esses males são consequências óbvias da desigualdade. O livro de Wilkinson e Pickett poderá ser um dia lembrado como a obra que mudou a abordagem do problema da desigualdade. Nenhum defeito da obra pode lhes tirar esse mérito

A tentação de Evo
Claro enigma
Conversa com Confúcio Moura
Holofote
O tempo esquentou no Planalto
O turismo acidental
Quem é desenvolvimentista (Maílson da Nóbrega)
Relações Impróprias
Sobe Desce
Soluções para evitar outra tragédia
Veja essa
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Carta Capital - 24/01/2011

ABANDONADOS À PRÓPRIA SORTE: AFOGADOS NO DESCASO
Autor: Gerson Freitas Jr
A história se repete. O governo culpa os céus, mas o povo padece é da negligência das autoridades

“O Brasil não é Bangladesh e não tem nenhuma desculpa para permitir, no século XXI, que pessoas morram em deslizamentos de terra causados por chuvas.” A crítica da consultora externa da ONU e diretora do Centro para a Pesquisa da Epidemiologia de Desastres, Debarati Guha-Sapir, resume com precisão o absurdo da tragédia. Até a tarde da quinta-feira 20, a Defesa Civil contabilizava mais de 750 mortos, 200 desaparecidos, 7.780 desalojados e 6.360 desabrigados nos municípios de Petrópolis, Teresópolis, Nova Friburgo e Areal. Os prejuízos materiais ainda não foram completamente calculados, mas o Banco Mundial já anunciou a liberação de 485 milhões de dólares (cerca de 820 milhões de reais) para a reconstrução das cidades devastadas pelas chuvas que atingiram a região desde a madrugada da terça-feira 11.

As autoridades, como de praxe, atribuem a responsabilidade ao clima hostil. Para especialistas, não poderia existir justificativa mais esfarrapada. Um país acostumado a enfrentar temporadas de chuvas intensas no verão e que está entre as dez maiores economias do mundo deveria, há muito tempo, estar preparado para enfrentar situações como essa. Sem rodeios, o diário francês Le Monde condenou a “negligência criminosa” das autoridades brasileiras. “A prevenção não faz parte dos discursos dos políticos, totalmente focados em ações imediatas, porque isso daria pouco retorno a eles nas eleições”, afirma o contundente artigo, publicado na quinta 20.

Além do clima, não faltou quem culpasse as próprias vítimas por morar em situação precária – outro argumento de um cinismo atroz. “Ninguém mora em área de risco porque quer ou porque é burro, e sim porque não tem nenhuma opção de moradia para a renda que possuem”, irrita-se a urbanista Raquel Rolnik.

Deploráveis distorções
Direito de resposta
O discreto estilo de Dilma Rousseff
Os males do serrismo (Vox Populi)
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Isto é - 24/01/2011

NOVA CARA, VELHO HÁBITO
Alexandre Tombini, o novo presidente do Banco Central, mantém a cartilha: para atacar a inflação, o BC aumenta a taxa de juros
Autor: Adriana Nicacio

Na quarta-feira 19, por volta das 16h30, um descontraído Alexandre Tombini entrou na sala de reuniões do 20º andar do edifício-sede do Banco Central, em Brasília, para iniciar o segundo dia de discussões sobre o futuro da taxa de juros. Os outros seis diretores do BC já se encontravam no local. Com um fichário preto, agenda e caneta Bic numa das mãos e um celular blackberry na outra, Tombini se mostrava tranquilo para sua estreia no comando do Comitê de Política Monetária (Copom). Havia algo diferente no ar. Desde junho de 2005, o presidente do Banco Central participa dessas reuniões – ao todo já foram 47 –, mas, pela primeira vez, não havia na sala um economista experimentado no mercado financeiro, além do próprio Tombini. Depois de quase quatro horas de uma conversa técnica, baseada em modelos e indicadores do BC, o Copom da era Tombini apresentou seu cartão de visitas. Por unanimidade, o colegiado elevou a taxa básica de juros de 10,75% para 11,25% ao ano, o que representa o maior patamar desde março de 2009. O objetivo é encarecer o crédito para atacar a inflação.

Durante a reunião do Copom, ao analisar a evolução e as perspectivas para a economia brasileira e internacional, os integrantes da mesa sugeriram um aumento de 0,75 ponto percentual, em vez de 0,5. Ao optar por uma alta de meio ponto, a diretoria do BC mostrou que ainda confia nos resultados da redução de gastos de cerca de R$ 30 bilhões por parte do governo, conforme meta estabelecida pela presidente Dilma Rousseff. Em nota, o Copom disse que está “dando início a um processo de ajuste da taxa básica de juros, cujos efeitos, somados aos de ações macroprudenciais, contribuirão para que a inflação convirja para a trajetória de metas.” Ao se referir às ações “macroprudenciais” da equipe econômica, o Banco Central fez um aceno amistoso aos colegas do Ministério da Fazenda. Na visão da Fazenda, a inflação é causada por fatores temporários, como a valorização das commodities, e os preços tendem a se acomodar nos próximos meses. O BC, por enquanto, assina embaixo.

O mercado aposta que haverá mais dois aumentos de 0,5 ponto até a Selic se estabilizar e voltar a cair. A decisão do Copom deixou clara a preocupação em evitar que o aumento de preços, mesmo que sazonal, contamine a economia. “O aperto não deve ser composto de muitas altas de juros. O Copom colocou um pouco de água na fervura”, diz o economista-chefe do WestLB, Roberto Padovani. Como sucessor de Henrique Meirelles, Tombini precisava fazer conhecer sua autonomia e também seu compromisso de não deixar correr frouxo o aumento de preços. Nada indica, porém, que o BC esteja vendo maiores turbulências à frente. E, acima de tudo, continua de pé a disposição da presidente Dilma de ver os juros caírem a médio prazo. “O ciclo de aumento dos juros deve ser curto para, inclusive, não afetar ainda mais o câmbio. Os juros não vão demorar a cair em 2012”, diz Carlos Thadeu de Freitas Gomes, ex-diretor do BC e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio.

""Chama o Palocci"" (Brasil Confidencial)
""Covardia na vaga especial""
"A Maria da Penha me transformou num monstro"
"Um jantar para Dilma"
"Votar em corrupto é votar na morte"
A dura vida numa região devastada
A volta do bicho-papão
Ariadna e Caramelo (Leonardo Attuch)
Braçadas de partida (Ricardo Boechat)
Dilma de ferro
Modernidade e desordem
Os fantasmas do Araguaia
SAUDADES DA GUANABARA
Sorriso da presidente
Toque de recolher
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Época - 24/01/2011

Por que somos solidários: A força da solidariedade
Autor(es): Martha Mendonça e Letícia Sorg Com Humberto Maia Junior, Nelito Fernandes, Rafael Pereira e Maurício Meireles

O que explica os atos de altruísmo e caridade que mobilizam a sociedade para ajudar as vítimas de tragédias como as enchentes do Rio de Janeiro

Era dia de sol no feriado de São Sebastião, padroeiro do Rio de Janeiro. Mal a quinta-feira amanheceu, a estudante de enfermagem Caroline Martins, de 21 anos, acordou e saiu de casa. Seu destino não era a praia. Uma hora e meia depois, ela estava entre os mais de 100 voluntários que trabalhavam no Ginásio Poliesportivo Pedro Jahara, no centro de Teresópolis, uma das cidades com mais mortos e desabrigados pela tragédia das chuvas no Estado. Munida de cuidado e paciência, ela fazia a triagem de toneladas de roupas que chegaram ali por meio de doações. As arquibancadas, que têm capacidade para 5 mil pessoas, estavam lotadas. Seu primeiro trabalho era separar o que servia. Muita coisa chegava rasgada ou mofada. Depois, dividia entre masculino, feminino, infantil e ainda calçados e acessórios. O material era enviado a outro grupo, que, na quadra central, o separava por tamanho e tornava tudo disponível para as famílias que procuravam o local. “Nessas horas, ajudar dá mais prazer do que se divertir”, diz Caroline. Ela subiu a serra para integrar alguma equipe de saúde, já que está no 6º período da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Adepta de corrida e judô, ela acreditava que poderia entrar em locais perigosos para ajudar quem precisava. Mas não conseguiu. “Então arregacei as mangas e arrumei outra forma de cooperar”, diz. Antes de a noite chegar, ela esperava encontrar um lugar para ficar por pelo menos três noites: “Se não conseguir, não tem problema. Durmo aqui mesmo”.

Na semana passada, o que não faltava nas cidades atingidas pelas enchentes eram Carolines. “Oi, eu vim aqui ajudar. O que posso fazer?” Era o que se ouvia a cada minuto na entrada do ginásio de Teresópolis, que concentra boa parte do trabalho social da cidade. E não só lá. Em Nova Friburgo, Petrópolis e em todas as cidades menores e nos vilarejos devastados da região serrana, onde o número de desabrigados superava os 20 mil, moviam-se legiões de voluntários que vinham de toda parte do país para ajudar. Simplesmente ajudar.

O empresário Nélio Zaúde, de 48 anos, poderia seguir sua rotina de fabricante de máquinas e termoplásticos na cidade de São Roque, em São Paulo. Mas não. Ele deixou a família na quinta-feira para levar pessoalmente, de caminhão, numa viagem de 12 horas, 9 toneladas de donativos até Nova Friburgo. Foram coisas que eles e seus funcionários conseguiram em um dia de coleta. No ano passado, durante as enchentes de Santa Catarina, fez a mesma coisa: foi até lá e se enfiou na lama para ajudar. “Não dá para dormir no quentinho, comer do melhor, enquanto muitos, que perderam amigos e parentes, estão passando fome, em meio à sujeira”, diz Zaúde. “Não dá para ficar sentado sem fazer nada.”

No ranking dos países mais solidários, o Brasil ocupa a 76ª colocação. É uma posição ruim

A professora Quitéria da Silva Lima, de 49 anos, moradora da cidade de Paulo Jacinto, a 100 quilômetros de Maceió, sentiu o mesmo impulso. Ela foi à rádio local sensibilizar as pessoas de seu município para colaborar com doações. Resultado: a garagem de sua casa acabou tomada por roupas, colchões e sapatos. Em junho, a cidade de Paulo Jacinto ficou submersa após as chuvas que mataram 27 pessoas e afetaram cerca de 200 mil no Estado. Quitéria não estava entre as vítimas, mas viu pessoas perder tudo. “Recebemos ajuda de todo o Brasil. Não nos faltou nada.” Foi nisso que pensou quando viu as notícias das mortes e de pessoas desabrigadas na região serrana do Rio de Janeiro. “Agora que estamos bem, podemos ajudar”, afirma. “Não conhecemos as pessoas, elas são de regiões mais ricas do que a nossa, mas são filhos de Deus e nossos irmãos. Temos obrigação de ajudar.”

Posto assim, com tanta naturalidade, parece simples. Mas, em verdade, não é. De onde vem o sentimento de solidariedade? Numa sociedade em que as preocupações pessoais e familiares são amplamente dominantes, o que leva pessoas como Quitéria, Zaúde e Caroline a deixar de lado o cuidado com os próprios interesses para preocupar-se com os problemas de estranhos? Qual é o pedaço de nossa natureza ou de nossa cultura que responde pelo impulso do altruísmo, aquele que nos torna capazes de sacrificar nosso bem-estar (e às vezes a própria vida) para ajudar outras pessoas? Em janeiro de 2007, Wesley Autrey, um nova-iorquino como qualquer outro, saltou à frente de um trem de metrô para salvar a vida de um senhor que havia desmaiado e caído nos trilhos. Por pouco ele mesmo não morreu. O que explica isso? Ou, de forma menos dramática, o que move o consagrado ator americano Sean Penn? Milionário e ganhador de dois Oscars, ele fez questão de enfiar-se na lama deixada pelo Furacão Katrina, em 2005, para ajudar as vítimas da inundação. No ano passado, ajudou a criar uma organização para ajudar a reconstrução do Haiti, devastado por um terremoto. Aos 50 anos, talentoso e estimado, ele poderia cuidar integralmente de seus projetos artísticos, mas promete dedicar-se ao Haiti de forma permanente. “Não existe um ponto final”, diz ele. “É aqui que eu vou estar quando não estiver trabalhando, pelo resto de minha vida.”

Entre Sean Penn e os ativistas do Facebook que criaram o Minha Ajuda Sua Casa – um movimento de solidariedade aos moradores da serra fluminense que já arregimentou 50 caminhões de doações e mobilizou mais de duas centenas de voluntários no Rio – existe o sentimento comum de que não se pode ficar indiferente ao sofrimento humano. É uma tradução prática do famoso poema em que John Donne sugeria, no século XVI: “Não pergunte por quem os sinos dobram, eles dobram por ti”. A ideia de que formamos uma comunidade na qual todos são responsáveis por todos é tão antiga como as religiões, mas raramente se torna tão visível quanto nos momentos de tragédia. De alguma forma esses eventos catastróficos parecem cutucar nossa s humanidade e acender em nós o desejo de agir em prol do outro. Isso aconteceu no terremoto do Haiti em escala global e está se repetindo agora, em termos brasileiros, no Rio de Janeiro. E isso parece ter alguma relação estreita com o trabalho da imprensa.

Desde a cobertura da Guerra da Biafra, no anos 60, quando a televisão mundial transmitiu, pela primeira vez, as imagens agora tristemente comuns de crianças africanas à beira da morte por inanição, o noticiário sobre os dramas humanitários de qualquer natureza tornou-se uma imposição jornalística – e traz com ela, invariavelmente, ondas de comoção pública e mobilização coletiva, na forma de ajuda material e humanitária. “A vergonha é um motor poderoso para ações. Se as pessoas se sentem desconfortáveis por não agir de forma altruísta, isso pode produzir mudanças de atitude, pode fazê-las olhar para os lados e ajudar os outros”, diz o pesquisador israelense Oren Harman, autor do livro O preço do altruísmo. “Por isso, a mídia tem um papel fundamental. Ela consegue chegar a cada casa por televisão, internet, celular e rádio.”

Há outro componente que parece entrar em ação nesses grandes desastres: a ameaça ao grupo. A teoria evolucionista e a sociologia sugerem que, quando um grupo é ameaçado, muitos de seus integrantes se unem para cooperar em escala muito maior do que fariam normalmente. Isso, segundo Harman, pode ter a ver com a experiência histórica: quando os grupos competem entre si, aqueles com mais indivíduos altruístas são mais bem-sucedidos, porque há maior cooperação. Dentro do grupo, até faz sentido para o indivíduo, do ponto de vista puramente racional, ser egoísta, porque o egoísta não precisa pagar nenhum preço e ainda goza da ajuda de todo mundo. Mas, se o grupo é ameaçado, o comportamento altruísta aumenta, por uma questão de sobrevivência coletiva. Biólogos, antropólogos e sociólogos estudam as condições particulares em que o interesse do grupo pode sobrepujar o interesse do indivíduo. “As tragédias nacionais e as guerras parecem ser mecanismos fortes para catapultar a ação em grupo”, diz Harman. Os altruístas agem altruisticamente o tempo todo, mas as grandes crises coletivas produzem milhões de novos altruístas.

Os cientistas que estudam esses comportamentos humanos têm uma definição específica de altruísmo, para diferenciá-lo de ações ou sentimentos da mesma família, como empatia e solidariedade. O altruísmo não é um sentimento sem consequências ou sem custo. Ele implica sacrificar alguma coisa em nome do outro, como no caso extremo de Tony Villela, um surfista do Guarujá, em São Paulo. Em 2008, ele perdeu a vida ao salvar um grupo de banhistas que era arrastado pela correnteza, como já fizera em outras ocasiões. Tirou o grupo da correnteza, mas perdeu a prancha e foi arrastado para as pedras, onde morreu. Coisas como essa acontecem o tempo inteiro, em toda parte do mundo, e são inexplicáveis à luz do mero egoísmo. Há um impulso que leva alguns a sacrificar-se pelos outros e ele só pode ser entendido pela cultura, não por um tipo de biologia que vê o homem apenas como lobo do homem.

“Acho possível promover o altruísmo a partir da educação das crianças pequenas”, diz Judith Lichtenberg, professora de filosofia da Universidade Georgetown, em Washington. “É possível ensiná-las a entender que seu bem-estar depende do bem-estar do próximo.” De certa maneira, ela compara, seria como instigar as crianças a agir como mãe, que quer o melhor para seu filho e se sacrifica pelo bem dele. Talvez essa seja uma espécie de utopia. Mas certamente os exemplos têm enorme influência em como os jovens se portam na assistência aos necessitados, em quaisquer circunstâncias. Se você é ensinado a respeitar os outros como a si mesmo, sua posição sobre a vida e os outros será diferente daquela de alguém que aprendeu apenas a buscar o primeiro lugar num mundo competitivo.

“Os americanos têm uma cultura que ensina a ser generoso dentro do país. Nossa cultura ainda tem o viés de levar vantagem em tudo, o que desfavorece a solidariedade”, diz Ronald Cavalcanti Ledo Filho, psicólogo e professor da Universidade Católica de Petrópolis. Ronald viveu vários anos nos Estados Unidos, onde estudou, e destaca a prática comum de doação para universidades e hospitais. No Brasil, a cultura da filantropia é menos difundida. Mesmo a ideia de ser voluntário não está tão clara para muitos. “Alguns doam seu tempo, trabalho ou talento, mas, apesar disso, não se consideram voluntários”, diz Silvia Maria Louzã Naccache, coordenadora de organizações sociais do Centro de Voluntariado de São Paulo. Atitudes simples como doar sangue ou organizar a coleta seletiva de lixo do condomínio são consideradas voluntariado, e poucos sabem disso. Talvez por isso o Brasil apareça em má posição no World Giving Index, que compara a disposição de doar de cidadãos de diferentes países.
Feito pela Charity Aid Foundation com o Instituto Gallup, o WGI é uma das primeiras pesquisas a comparar o comportamento solidário globalmente. O estudo reúne dados de 153 países e foi baseado em entrevistas por telefone com amostras de 1.000 indivíduos. Os entrevistados tiveram de responder a três questões: se tinham doado tempo, dinheiro ou ajudado um estranho no último mês. No Brasil, 15% doam tempo, 25% doam dinheiro e 49% ajudam estranhos. É abaixo da média mundial, e dá ao país apenas a 76a colocação no ranking da solidariedade. “A posição do Brasil está em descompasso com o potencial que o país tem”, diz Márcia Woods, diretora do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (Idis), que ajudou na realização da pesquisa, divulgada em dezembro do ano passado. Embora o Terceiro Setor esteja cada vez mais organizado no país, os brasileiros ainda são muito reativos em termos de filantropia. Tendem a doar uma quantia maior em situações de emergência. Poucos mantêm uma ajuda constante a uma causa. A falta de transparência e de comunicação sobre os resultados das doações não estimula os brasileiros a continuar doando. Uma estratégia para incentivar quem se solidarizou com a tragédia no Rio a seguir engajado é garantir informações sobre o destino das doações e seu resultado na vida das pessoas afetadas.

A situação na serra ainda não permite relaxar o esforço coletivo. A semana passada começou com um susto: voltou a chover no domingo, e um novo deslizamento em Petrópolis matou mais três pessoas. A conta de mortos não fechava e não parava de crescer. A conta da reconstrução também se agrava a cada dia. A estimativa do governo do Estado é que serão necessários pelo menos R$ 2 bilhões para recuperar o estrago. Em Nova Friburgo, a garrafa de água mineral chegou a ser vendida com um ágio de 300%. O governo decretou estado de calamidade pública em sete cidades e ameaçou de prisão os comerciantes que cobravam preços abusivos por crime contra a economia popular.

O Ministério Público determinou a retirada dos habitantes de 18 localidades, mesmo contra sua vontade. O Estado e a prefeitura do Rio anunciaram medidas para evitar novas tragédias. Na capital, foram instaladas as primeiras das 60 sirenes que emitirão sinais de alerta em caso de risco de chuva forte e desabamentos. O Estado anunciou a compra de radares por R$ 2,5 milhões.

Em meio a tanta dor, houve espaço para o riso. Um vira-lata chamado Caramelo ganhou os noticiários porque teria ficado ao lado da cova de sua dona, morta na enchente. Foi notícia no mundo inteiro. Depois, descobriu-se que o cachorro, na verdade, era do coveiro do cemitério. O cachorro da vítima era outro, que já estava adotado por uma família na Barra da Tijuca. Caramelo chegou a virar um ícone da lealdade e da amizade na enchente. Mas o verdadeiro símbolo foi o povo do Rio, leal aos que passavam por dificuldade na serra. Os exemplos estavam por toda parte.A ex-modelo Luma de Oliveira foi uma das que se juntaram à rede de solidariedade que se formou no Rio. Ela comprou mantimentos, fraldas, água e, na hora de procurar um caminhão para levar as doações, contou com a ajuda do dono da transportadora. Ela levou parte das doações numa picape, enquanto o restante seguiu no caminhão. Luma conta que resolveu levar pessoalmente para agilizar a entrega: “Sinto agonia de fazer mais”, disse.

Em Teresópolis, o galpão cedido por uma distribuidora de bebidas do bairro Meudon é a maior referência para os desabrigados. Chegaram a morar no galpão, na semana da tragédia, 390 pessoas. Ali, histórias de vítimas e voluntários se misturam no relato de Robério Yath, de 29 anos. Morador da cidade e gerente de um restaurante, ele perdeu sete parentes – tios e primos – em deslizamentos no bairro da Posse, um dos mais afetados. Desde o primeiro momento, resolveu ajudar. “É o melhor jeito de aplacar a dor”, afirma. Experiente, assumiu parte da organização e distribuição dos mantimentos. Diz que nunca viu mobilização tão grande. “Essa união das pessoas é a melhor coisa da vida”, afirma. “Estamos aprendendo que o amor é ação.”

No mesmo galpão está o casal Dário e Priscila Araújo. Ele, profissional de logística. Ela, dona de casa. Deixaram uma filha de 10 anos e outra de apenas 10 meses na casa dos avós para ajudar. Moradores do município de Duque de Caxias, no pé da serra, evangélicos, dizem que tentam ajudar a confortar quem perdeu tudo. Eles elogiam a postura dos desabrigados que não se colocam apenas na posição de vítimas, mas querem dividir as tarefas. Na tarde da quinta-feira, duas contadoras de histórias voluntárias levaram seus violões para cantar e entreter as crianças do galpão. “Vamos sofrer na hora de ir embora”, diz Priscila. “Falei com minha filha mais velha, e ela disse que estava com saudades. Respondi que eu voltaria para casa uma mãe melhor.”

O que o evolucionismo de Charles Darwin teria a dizer sobre esse comportamento? Afinal, abandonar a própria prole para atender às necessidades de desconhecidos não parece o tipo de coisa que se associa com a “luta pela vida” e a “sobrevivência do mais apto”. Formulada no século XIX, a teoria darwiniana de seleção natural tornou-se, em sua forma vulgar, uma espécie de justificativa biológica do egoísmo. O próprio Darwin, um homem profundamente moral, jamais viu as coisas desse modo. Ele acreditava em algo chamado seleção do grupo. Um indivíduo poderia levar vantagem pessoal desobedecendo a regras, mas a tribo que enfatizasse lealdade, coragem e solidariedade teria mais sucesso na disputa por espaço e por recursos. Como ele não elaborou esse aspecto de seu pensamento, prevaleceu a visão que explica a evolução como um processo fundamentado apenas no “cada um por si”. Atualmente, existem visões mais sutis da questão. Elas propõem que, mesmo para o indivíduo egoísta, haveria vantagens em se sacrificar pelos demais. Uma explicação, conhecida como altruísmo recíproco, diz que os indivíduos se sacrificam pelos outros esperando receber o mesmo tratamento numa situação semelhante. Outra forma de ver a questão sugere que ajudar uma (ou muitas) pessoa de seu grupo aumentaria as chances de perpetuar seus próprios genes, porque você precisa de seu grupo para se manter vivo. “Como o ser humano é uma espécie social por excelência, a hipótese de que comportamentos altruístas tenham ajudado a espécie a sobreviver fica fortalecida”, diz Ana Arantes, psicóloga do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de São Carlos.

A observação do comportamento animal reforça a ideia do altruísmo evolutivo. O pesquisador Shinya Yamamoto, da Universidade de Kyoto, observou seis pares de chimpanzés em cativeiros para entender como eles se comportariam em testes de solidariedade. Descobriu que, trancados em jaulas separadas e recebendo ferramentas diferentes para obter água e comida, os chimpanzés passavam as ferramentas de que os vizinhos precisavam mesmo sem receber nada como retorno. A passagem da ferramenta ocorria mais rápido quando o outro pedia, mas era sempre espontânea.

O que isso ensina sobre o altruísmo humano? Pouco. Nós não somos macacos e habitamos há pelo menos 50 mil anos um Universo dominado por valores culturais, tanto quanto por necessidades físicas e impulsos ancestrais. Devido a esse emaranhado de fatores, é impossível entender por que somos capazes de nos comover com o sofrimento dos outros e agir de maneira nobre para ajudá-los. Talvez esteja em nossos genes, talvez não. Eis o que diz o pesquisador Harman: “As pessoas fazem o bem por razões que parecem conflitantes, mas não são. Ajudar um estranho pode satisfazer na mesma medida o senso de justiça social e a necessidade do indivíduo de se sentir bem consigo mesmo. Portanto, não tenho certeza de que seja importante entender as motivações por trás dos atos altruísticos das pessoas. O que conta, no final do dia, é o resultado dessas ações. O fato de que pessoas receberam ajuda e cuidado é que é importante."

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Ajuda de pai para filho
Cadê a universidade anunciada aqui?
Dilma se afasta do Irã
Dois pontos
É mais fácil abrir empresa lá fora
Melhor para a China
Minha vida após a tragédia
O retorno do ditador
O risco viagem
Por que o trabalhador está mal protegido
Salvador ladeira abaixo
Sorte na tragédia (Vamos Combinar)
Uma razão para se orgulhar
Xiii, tuitei demais!
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